Leia o texto a seguir.
O FIM DO SONHO
Ruy Castro
Eles nunca mais vestirão a camisa do clube que amavam ou viriam a amar. Nunca mais a suarão nos treinos,
em que davam tudo para se superar e superar os colegas com quem dividiam o esforço, a dedicação e os sonhos
— dividiam também o alojamento fatal. Nunca mais esperarão a hora de ser chamados no banco, tirar o agasalho
e entrar em campo para mostrar o que sabiam. Nunca mais ansiarão pela bola que viria do alto para o seu
domínio ou pelo passe de um companheiro, à feição do chute que levaria ao gol consagrador. Nunca mais
receberão uma bola.
O goleiro nunca mais precisará exercitar sua capacidade de concentração, a ser desenvolvida nas menores
ocorrências do dia a dia — para que, sob seu gol, ele pudesse esperar pelo inesperado, prever o imprevisível e
defender o indefensável. Como último baluarte, atrás da linha de seus companheiros, estas eram suas
responsabilidades. Agora essas responsabilidades cessaram — ele pode finalmente relaxar. O mesmo com o
zagueiro — a ameaça do atacante adversário invadindo a área com seu poder de choque, a ser enfrentada com
poder equivalente e neutralizada, fica agora suprimida. Quem sabe os dois não eram amigos, quase irmãos, fora
de campo? Pois agora o serão para sempre — e apenas isto, não mais adversários [...].
Era um sonho maravilhoso, interrompido por uma entrada cruel e desleal do destino quando apenas
começava a se tornar realidade. Eles nunca mais sonharão
Disponível em: https://wwwl.folha.uol.com.br/colunas/ ruycastro/2019/02/o-fim-do sonho.shtml. Acesso em 20
fev. 2019.