Quando soube daquele oráculo, pus-me a refletir assim: “Que quererá dizer o Deus? Que sentido oculto pôs na resposta? Eu cá não tenho consciência de ser nem muito sábio nem pouco; que quererá ele então significar declarando-me o mais sábio? Naturalmente não está mentindo, porque isso lhe é impossível”. Por longo tempo fiquei nessa incerteza sobre o sentido; por fim, muito contra meu gosto, decidi-me por uma investigação, que passo a expor.
(PLATÃO. Defesa de Sócrates. Trad. Jaime Bruna. Coleção Os Pensadores. Vol. II. São Paulo: Victor Civita, 1972, p. 14.)
O texto acima pode ser tomado como um exemplo para ilustrar o modo como se estabelece, entre os gregos, a passagem do mito para a filosofia. Essa passagem é caracterizada:
a) pela transição de um tipo de conhecimento racional para um conhecimento centrado na fabulação.
b) pela dedicação dos filósofos em resolver as incertezas por meio da razão.
c) pela aceitação passiva do que era afirmado pela divindade.
d) por um acento cada vez maior do valor conferido ao discurso de cunho religioso.
e) pelo ateísmo radical dos pensadores gregos, sendo Sócrates, inclusive, condenado por isso.