Questões de Concursos Públicos: Interpretação Textual 8 Compreensão e Interpretação de Textos

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    Além das palavras

                 Pesquisadores da USP elaboraram uma lista de gestos,

                   posturas e outras pistas visuais que podem auxiliar o

           médico na avaliação dos pacientes e diagnóstico da depressão.


      No consultório psiquiátrico, apenas uma parte das informações é verbalizada pelos pacientes. Outra tem a ver com o olhar do médico: uma avaliação de gestos, posturas e outros sinais que podem ajudar a compreender o estado de saúde mental em que uma pessoa se encontra. Uma proposta de sistematização desse ‘olho clínico’ foi apresentada por pesquisadores do Instituto de Psiquiatria da Universidade de São Paulo (USP), que elaboraram um checklist de posturas, gestos e expressões típicos de pacientes com depressão.

      O estudo foi realizado no Hospital das Clínicas e no Hospital Universitário, ambos ligados à USP, sob a supervisão da farmacologista Clarice Gorenstein. Em vez de seguirem apenas o protocolo corrente de diagnóstico de depressão, baseado em perguntas e respostas, avaliadores preencheram um formulário detalhado sobre as expressões faciais e corporais dos pacientes durante entrevistas clínicas. As entrevistas também foram filmadas, para análise objetiva do comportamento dos pacientes.

      “Elaboramos uma lista de comportamentos corporais favoráveis ou não ao contato social para analisar os pacientes, além de fazer as perguntas padrão”, relata a pesquisadora e psicóloga Juliana Teixeira Fiquer, que realizou seu pós-doutorado com o estudo. “Sinais como inclinar o corpo para frente na direção do entrevistador, ou encolher os ombros, fazer movimentos afirmativos ou negativos com a cabeça, fazer contato ocular ou não, rir ou chorar são alguns dos 22 comportamentos que selecionamos”, exemplifica.

      Fiquer contou à CH Online que todos os pacientes do grupo com depressão tiveram melhora nos parâmetros sugestivos de contato social. “Os pacientes mostraram, após o período de tratamento, um aumento no contato ocular com o entrevistador, além de sorrir mais e demonstrar avanços em relação a outros comportamentos sugestivos de interesse social”, relata.

      “Queremos criar um método científico que considere aquilo que até então é colocado no território das impressões no diagnóstico da depressão.”

      Para a pesquisadora, o trabalho representa um passo importante na sinalização de que informações emocionais relevantes são transmitidas no contato interpessoal entre clínico e paciente, que até então eram atribuídas exclusivamente à subjetividade do médico na hora de fazer o diagnóstico.

      O psiquiatra e psicanalista Elie Cheniaux, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, sugere que a linguagem não verbal é uma ferramenta importante para mensurar a tristeza, que é um dos componentes da depressão, mas não a única. “A linguagem não verbal não dá uma visão global do quadro do paciente”, argumenta.

(João Paulo Rossini. Instituto Ciência Hoje – RJ. Em abril de 2016. Com adaptações.)

Considerando as informações textuais sobre a depressão, é possível inferir que:
Texto associado.
Atenção: Para responder a questão, baseie-se no texto abaixo. 

Darwin nos trópicos

        Ao desembarcar no litoral brasileiro em 1832, na baía de Todos os Santos, o grande cientista Darwin deslumbrou-se com a natureza nos trópicos e registrou em seu diário: “Creio, depois do que vi, que as descrições gloriosas de Humboldt* são e sempre serão inigualáveis: mas mesmo ele ficou aquém da realidade”. Mas a paisagem humana, ao contrário, causou-lhe asco e perplexidade: “Hospedei-me numa casa onde um jovem escravo era diariamente xingado, surrado e perseguido de um modo que seria suficiente para quebrar o espírito do mais reles animal.”
          O mais surpreendente, contudo, é que a revolta não o impediu de olhar ao redor de si com olhos capazes de ver e constatar que, não obstante a opressão a que estavam submetidos, a vitalidade e a alegria de viver dos africanos no Brasil traziam em si a chama de uma irrefreável afirmação da vida. Darwin chegou mesmo a desejar que o Brasil seguisse o exemplo da rebelião escrava do Haiti. Frustrou-se esse desejo de uma rebelião ao estilo haitiano, mas confirmou-se sua impressão: a África salva o Brasil.

*Alexander von Humboldt (1769-1859): geógrafo, naturalista e explorador prussiano.
(Adaptado de: GIANETTI, Eduardo. Trópicos utópicos. São Paulo: Companhia das Letras, 2016, p. 167/168) 
No segundo parágrafo do texto, a vitalidade e a alegria de viver dos africanos são consideradas de modo a ressaltar a
Texto associado.

Faces do futuro


      Se há um choque de princípios que marcará a sociedade nos próximos anos é aquele entre a comodidade e a segurança, de um lado, e a privacidade, de outro.

      Como mostrou reportagem do jornal The New York Times reproduzida por esta Folha, avanços no campo do reconhecimento de faces por computador lançam novos dilemas. Empresas podem reter dados faciais de seus clientes? Devem obter autorização para fazê-lo? E o que dizer do governo?

      Hoje em dia, algumas companhias conseguem, usando bancos de dados gigantescos e algoritmos relativamente simples, rastrear os hábitos dos consumidores a ponto de conhecer sua intimidade. Uma rede de varejo norte-americana, por exemplo, desenvolveu um método para detectar a gravidez de suas clientes. Com a informação vieram ofertas irresistíveis.

      Investidas como essas se sobrepõem a outros avanços tecnológicos, como câmeras de vigilância mais potentes e chips de cartões bancários capazes de revelar quanto o cidadão gastou e onde ele esteve. A isso se somam os drones, que localizam, e eventualmente liquidam, até quem se esconde nas áreas mais remotas do planeta.

      Agências governamentais não hesitam em usar tais métodos para a bisbilhotice em massa.

      Reconheça-se, porém, que a maioria das pessoas se entrega voluntariamente a essa hipervigilância – para nada dizer da superexposição vista nas redes sociais. 

      Cadastros na internet podem trazer, como contrapartida, ofertas personalizadas por e-mail, que representam inegável conforto. A utilização da tecnologia de ponta pelas polícias, por sua vez, aumenta a capacidade de prevenir e resolver crimes, ampliando a sensação de segurança da população.

      Para que o cruzamento de ferramentas como grandes bancos de dados, reconhecimento facial, câmeras de vigilância e drones não se aproxime demais da distopia de George Orwell em 1984, é crucial que sejam criados limites.

      Um bom começo seria determinar que dispositivos dessa natureza só sejam usados com a ciência do cidadão, a quem cabe decidir se quer fazer parte da trama.

(Por ‘FSP’ em 17/06/2014 na edição 803. Disponível em: http://observatoriodaimprensa.com.br/e-noticias/_ed803_faces_do_futuro/.)

De acordo com as ideias trazidas ao texto sobre a utilização de um grande banco de dados que revelam, entre outros, hábitos dos indivíduos, pode-se afirmar que o posicionamento apresentado pelo articulista demonstra que para ele, o que importa é:

 Inovação sempre foi algo fundamental para o sucesso das empresas. Na atualidade, a capacidade de inovação se tornou questão de sobrevivência para a maioria das empresas, independentemente da atividade da organização. Não me refiro apenas àquelas empresas ligadas à tecnologia que notoriamente possuem inovação em seu DNA. Supermercados estão inovando. Empresas de construção civil estão inovando. Seja em relação ao produto ou ao serviço, à maneira de interagir com os clientes ou às estratégias que serão implementadas para conquistar mercado, todas as empresas que pretendem crescer buscam inovar.

      Ao contrário do que possa parecer, a habilidade de inovar requer muita disciplina. A ideia de que a inspiração precisa “baixar” para se poder inovar ou ser criativo é um mito. Mesmo parecendo um contrassenso, você pode desrespeitar todas as regras, porém de maneira disciplinada.

      O compositor austríaco Schoenberg desafiou todas as convenções da composição quando criou, no início do século XX, uma nova maneira de compor que se tornou conhecida como dodecafonismo. Mesmo que as composições de Schoenberg possam a princípio parecer difíceis de apreciar, a história da música reservou-lhe um lugar de destaque como um dos grandes compositores do século XX. Para desenvolver seu método revolucionário de compor, Schoenberg estudou com muita disciplina todas as técnicas de composição tradicionais e foi testando novas possibilidades até chegar ao dodecafonismo. Não foi algo que simplesmente aconteceu da noite para o dia.

(Adaptado de: GRINBERG, Renato. A excelência do olho de tigre. São Paulo: Editora Gente, 2016. edição digital). 

Considere as afirmações abaixo.


I. A referência a Schoenberg é um argumento que corrobora a ideia do autor de que a capacidade de inovar surge de maneira inesperada e abrupta a pessoas de imensurável talento.

II. O autor refuta a noção de que apenas empresas ligadas à inovação tecnológica são capazes de recorrer a soluções criativas para ampliar seus negócios.

III. A afirmação Não foi algo que simplesmente aconteceu da noite para o dia respalda o argumento, exposto anteriormente no texto, de que a habilidade de inovar requer muita disciplina.


Está correto o que se afirma APENAS em:

Texto associado.

Comprar menos é melhor do que comprar “verde”


Estudo indica que consumir em menor quantidade pode

gerar efeitos mais positivos do que aderir à onda do 

consumo de produtos ditos sustentáveis.


      O direito de comprar o que o dinheiro honestamente juntado permite é um dos bons e inegociáveis avanços do capitalismo – e, no entanto, de um tempo para cá, o exagerado consumismo foi levado ao tribunal do bom comportamento, e com doses de razão. Um estudo publicado no periódico inglês Young Consumers, de pesquisadores de marketing da Universidade do Arizona (EUA), fez barulho ao sugerir que consumir menos traz efeitos mais positivos para o ambiente e para cada indivíduo do que simplesmente substituir produtos por versões que, em teoria, seriam ecologicamente corretas.

      Os analistas se debruçaram em dois perfis de pessoas: aquelas com o hábito de reaproveitar bens, em vez de sair às compras; e os adeptos da aquisição de produtos “verdes”. De acordo com os pesquisadores, o primeiro grupo, menos afoito, apresentou índices mais altos de bem-estar pessoal, além de ter modo de vida pouco danoso para a natureza.

      O resultado da pesquisa bate de frente com uma indústria vigorosa. De acordo com a consultoria Nielsen, estima-se que 64% de lares dos Estados Unidos já compraram itens enquadrados como sustentáveis. Não há levantamento brasileiro, mas por aqui também é tendência forte. A consciência ambiental é sempre louvável. Mas convém ter cautela.

      Há alternativas conservacionistas que são vendidas como tal, mas que não se comprovam “verdes”. É o caso de canudinhos de metal, cuja fabricação demanda energia equivalente à usada para criar noventa modelos de plástico (ressalta-se: ainda é melhor que não se use canudo algum, muito menos os de plástico). Outro exemplo é o das “eco bags”. Para valerem do ponto de vista sustentável, seria necessário usar cada uma 104 vezes. Disse a VEJA Sabrina Helm, coordenadora do estudo da Universidade do Arizona: “Temos que ser conscientes, pensando no que é realmente útil para nossas vidas”. Soa simplório, mas é conselho bom e eficaz.

(Jennifer Ann Thomas, 28 out 2019. Disponível em: https://veja.abril.com.br/ciencia/comprar-menos-e-melhor-do-que-comprar-verde/.)

Das informações e ideias trazidas ao texto, infere-se corretamente que:
Texto associado.

 Templo descoberto no México revela como os astecas faziam sacrifícios humanos

 As execuções em nome do deus Xipe Totec aconteciamdurante um festival conhecido como Tlacaxipehualiztli que significa "esfolamento dos homens”

     

      Muitas civilizações pré-colombianas fizeram sacrifícios humanos. Mas, como várias delas não deixaram registros escritos, as teorias sobre como aconteciam esses rituais são baseadas apenas nos relatos dos colonizadores. Agora, vestígios físicos de um templo recém-descoberto no México podem ajudar a solucionar esse mistério. A edificação foi construída em homenagem ao deus Xipe Tótec, o “Lord Esfolado”, a principal divindade a quem eram dedicados esses sacrifícios.

      Xipe Totec está entre as mais antigas divindades pré-colombianas conhecidas. Acredita-se que ele tenha sido adorado por muitas culturas antigas, incluindo os astecas. Era venerado como o deus da primavera, do renascimento, da libertação e da fertilidade. Apesar de Xipe Totec estar no cânone dos deuses pré-colombianos, é a primeira vez que arqueólogos encontram um templo inteiramente dedicado a ele.

      A edificação tem 12 metros de largura por 3,5 de altura, foi erguida entre os anos 1000 d.C e 1260 d.C., e está localizada no sitio arqueológico de Ndachjian–Tehuacán, em Puebla, no México. Os arqueólogos afirmam que a etnia Popolocas construiu o templo, mas pouco tempo depois foi dominada pelos astecas.

      Os sacrifícios para Xipe Totec aconteciam durante um festival conhecido como Tlacaxipehualiztli — que significa, ao pé da letra, “esfolamento dos homens”. De acordo com um antigo mito, o deus estendia sua pele sobre a terra durante a primavera, renovando o solo com nova vegetação.

      Por isso, no festival, tirava-se a pele de humanos em uma cerimônia que simbolizava o renascimento, a fertilidade e a alternância das estações.

https://super.abril.com.br/historia/templo-descoberto-nomexico-revela-como-os-astecas-faziam-sacrificios-humanos/ Acesso em: 07/01/2019.

Com base nesse texto, assinale a alternativa FALSA.
Texto associado.

SERÁ??!!

Clara Braga

      Era uma vez um músico/compositor que, como muitos outros (provavelmente todos), sonhava em ter seu trabalho reconhecido e poder viver da sua própria música.

      Trabalhou duro e um belo dia, nos encontros que a música lhe proporcionava, conheceu uma pessoa e se apaixonou perdidamente. Ficou ainda mais inspirado, compôs várias músicas dedicadas ao seu novo amor e teve ainda mais motivação para acreditar que seu trabalho ganharia o reconhecimento merecido.

      Dito e feito, o tal músico ficou mais famoso do que ele mesmo imaginava ser possível, suas músicas estavam na boca do povo, embalando novos casais, tocando na entrada da noiva e sendo até tema de novela. Não tinha um que não desse um suspiro com suas músicas apaixonadas.

      Porém, um belo dia, o tal músico notou que as coisas já não eram mais como antes, que seu relacionamento trazia mais tristezas do que alegrias e que continuar era um erro. O casal decidiu se separar, e a decepção foi tão grande que cantar as músicas que fez para aquela pessoa que já não estava mais ao seu lado lhe causava muita dor!

      E agora, o que fazer? Mesmo que suas músicas lhe tragam dor e angústia, um mar de gente espera ansiosa e emocionada para ouvir aquelas músicas que, para eles, marcam os momentos mais felizes e importantes de suas vidas.

      Essa história é fictícia, mas me peguei pensando esses dias, será que existem muitos músicos nessa situação? Artistas que a cada apresentação precisam lidar com suas próprias dores para levar alegria a outras pessoas? Acho que nunca mais vou assistir a um show da mesma forma!

Disponível em: http://www.cronicadodia.com.br/2019/10/sera-clara-braga.html. Acesso em: 25 out. 2019.

De acordo com o texto, é correto afirmar que
Texto associado.

Faces do futuro


      Se há um choque de princípios que marcará a sociedade nos próximos anos é aquele entre a comodidade e a segurança, de um lado, e a privacidade, de outro.

      Como mostrou reportagem do jornal The New York Times reproduzida por esta Folha, avanços no campo do reconhecimento de faces por computador lançam novos dilemas. Empresas podem reter dados faciais de seus clientes? Devem obter autorização para fazê-lo? E o que dizer do governo?

      Hoje em dia, algumas companhias conseguem, usando bancos de dados gigantescos e algoritmos relativamente simples, rastrear os hábitos dos consumidores a ponto de conhecer sua intimidade. Uma rede de varejo norte-americana, por exemplo, desenvolveu um método para detectar a gravidez de suas clientes. Com a informação vieram ofertas irresistíveis.

      Investidas como essas se sobrepõem a outros avanços tecnológicos, como câmeras de vigilância mais potentes e chips de cartões bancários capazes de revelar quanto o cidadão gastou e onde ele esteve. A isso se somam os drones, que localizam, e eventualmente liquidam, até quem se esconde nas áreas mais remotas do planeta.

      Agências governamentais não hesitam em usar tais métodos para a bisbilhotice em massa.

      Reconheça-se, porém, que a maioria das pessoas se entrega voluntariamente a essa hipervigilância – para nada dizer da superexposição vista nas redes sociais. 

      Cadastros na internet podem trazer, como contrapartida, ofertas personalizadas por e-mail, que representam inegável conforto. A utilização da tecnologia de ponta pelas polícias, por sua vez, aumenta a capacidade de prevenir e resolver crimes, ampliando a sensação de segurança da população.

      Para que o cruzamento de ferramentas como grandes bancos de dados, reconhecimento facial, câmeras de vigilância e drones não se aproxime demais da distopia de George Orwell em 1984, é crucial que sejam criados limites.

      Um bom começo seria determinar que dispositivos dessa natureza só sejam usados com a ciência do cidadão, a quem cabe decidir se quer fazer parte da trama.

(Por ‘FSP’ em 17/06/2014 na edição 803. Disponível em: http://observatoriodaimprensa.com.br/e-noticias/_ed803_faces_do_futuro/.)

Dentre os segmentos destacados a seguir, assinale o que explicita um posicionamento do enunciador:
Texto associado.

Os horizontes da ciência

      A chegada do homem à Lua é possivelmente o feito científico e tecnológico que mais impactou o imaginário popular na era moderna. Tanto parecia um feito inatingível que até hoje circulam teorias conspiratórias de que tudo não passou de uma montagem norte-americana para capturar corações e mentes ameaçados pelo regime socialista.

      Acredite-se ou não, há quase 50 anos a cápsula de pouso Águia descia no mar da Tranquilidade, na face visível da Lua, e dois astronautas davam seus primeiros passos, ou pulos, no único satélite natural da Terra. Um conjunto de fatores levou a humanidade a esse feito, como disputas políticas, militares e tecnológicas entre nações, [...] Inspiradora da curiosidade humana, a exploração espacial fascina pessoas no mundo todo e permite a junção de três atividades essencialmente científicas – a descoberta, a compreensão e a aplicação desse conhecimento para alcançar um determinado fim.

      Sem pisar lá desde 1972, os Estados Unidos querem voltar, agora com a colaboração de outros países. Com orçamento menor do que na época da Guerra Fria, a Nasa conta hoje com a Agência Espacial Europeia e o Canadá. Outros atores têm a mesma ambição. A China, com um programa espacial em ascensão, planeja, sozinha, colocar um taikonauta na Lua.

(Alexandra Ozório de Almeida – Diretora da Redação. Carta da Editora, edição 280 – Junho 2019. Pesquisa FAPESP. Fragmento.)

De acordo com o texto:
Texto associado.

Natal na barca


      Não quero nem devo lembrar aqui por que me encontrava naquela barca. Só sei que em redor tudo era silêncio e treva. E que me sentia bem naquela solidão. Na embarcação desconfortável, tosca, apenas quatro passageiros. Uma lanterna nos iluminava com sua luz vacilante: um velho, uma mulher com uma criança e eu.

      O velho, um bêbado esfarrapado, deitara-se de comprido no banco, dirigira palavras amenas a um vizinho invisível e agora dormia. A mulher estava sentada entre nós, apertando nos braços a criança enrolada em panos. Era uma mulher jovem e pálida. O longo manto escuro que lhe cobria a cabeça dava-lhe o aspecto de uma figura antiga.

      Pensei em falar-lhe assim que entrei na barca. Mas já devíamos estar quase no fim da viagem e até aquele instante não me ocorrera dizer-lhe qualquer palavra. Nem combinava mesmo com uma barca tão despojada, tão sem artifícios, a ociosidade de um diálogo. Estávamos sós. E o melhor ainda era não fazer nada, não dizer nada, apenas olhar o sulco negro que a embarcação ia fazendo no rio.

      Debrucei-me na grade de madeira carcomida. Acendi um cigarro. Ali estávamos os quatro, silenciosos como mortos num antigo barco de mortos deslizando na escuridão. Contudo, estávamos vivos. E era Natal.

      A caixa de fósforos escapou-me das mãos e quase resvalou para o rio. Agachei-me para apanhá-la. Sentindo então alguns respingos no rosto, inclinei-me mais até mergulhar as pontas dos dedos na água.

      — Tão gelada — estranhei, enxugando a mão.

      — Mas de manhã é quente.

      Voltei-me para a mulher que embalava a criança e me observava com um meio sorriso. Sentei-me no banco ao seu lado. Tinha belos olhos claros, extraordinariamente brilhantes. Reparei em que suas roupas (pobres roupas puídas) tinham muito caráter, revestidas de uma certa dignidade.

      — De manhã esse rio é quente — insistiu ela, me encarando.

      — Quente?

      — Quente e verde, tão verde que a primeira vez que lavei nele uma peça de roupa pensei que a roupa fosse sair esverdeada. É a primeira vez que vem por estas bandas?

      Desviei o olhar para o chão de largas tábuas gastas. E respondi com uma outra pergunta:

      — Mas a senhora mora aqui por perto?

      — Em Lucena. Já tomei esta barca não sei quantas vezes, mas não esperava que justamente hoje…

      A criança agitou-se, choramingando. A mulher apertou-a mais contra o peito. Cobriu-lhe a cabeça com o xale e pôs-se a niná-la com um brando movimento de cadeira de balanço. Suas mãos destacavam-se exaltadas sobre o xale preto, mas o rosto era tranquilo.

      — Seu filho?

      — É. Está doente, vou ao especialista, o farmacêutico de Lucena achou que eu devia ver um médico hoje mesmo. Ainda ontem ele estava bem, mas piorou de repente. Uma febre, só febre…

      — Levantou a cabeça com energia. O queixo agudo era altivo, mas o olhar tinha a expressão doce. — Só sei que Deus não vai me abandonar.

      — É o caçula?

      — É o único. O meu primeiro morreu o ano passado. Subiu no muro, estava brincando de mágico quando de repente avisou, vou voar! E atirou-se. A queda não foi grande, o muro não era alto, mas caiu de tal jeito… Tinha pouco mais de quatro anos.

      Atirei o cigarro na direção do rio, mas o toco bateu na grade e voltou, rolando aceso pelo chão. Alcancei-o com a ponta do sapato e fiquei a esfregá-lo devagar. Era preciso desviar o assunto para aquele filho que estava ali, doente, embora. Mas vivo.

      — E esse? Que idade tem?

      — Vai completar um ano. — E, noutro tom, inclinando a cabeça para o ombro: — Era um menino tão alegre. Tinha verdadeira mania com mágicas. Claro que não saía nada, mas era muito engraçado… Só a última mágica que fez foi perfeita, vou voar! disse abrindo os braços. E voou.

      Levantei-me. Eu queria ficar só naquela noite, sem lembranças, sem piedade. Mas os laços (os tais laços humanos) já ameaçavam me envolver. Conseguira evitá-los até aquele instante. Mas agora não tinha forças para rompê-los.

      — Seu marido está à sua espera?

      — Meu marido me abandonou.

      Sentei-me e tive vontade de rir. Era incrível. Fora uma loucura fazer a primeira pergunta, mas agora não podia mais parar.

      — Há muito tempo? Que seu marido…

      — Faz uns seis meses. Imagine que nós vivíamos tão bem, mas tão bem. Quando ele encontrou por acaso essa antiga namorada, falou comigo sobre ela, fez até uma brincadeira, a Ducha enfeiou, de nós dois fui eu que acabei ficando mais bonito... E não falou mais no assunto. Uma manhã ele se levantou como todas as manhãs, tomou café, leu o jornal, brincou com o menino e foi trabalhar. Antes de sair ainda me acenou, eu estava na cozinha lavando a louça e ele me acenou através da tela de arame da porta, me lembro até que eu quis abrir a porta, não gosto de ver ninguém falar comigo com aquela tela no meio… Mas eu estava com a mão molhada. Recebi a carta de tardinha, ele mandou uma carta. Fui morar com minha mãe numa casa que alugamos perto da minha escolinha. Sou professora.

      Fixei-me nas nuvens tumultuadas que corriam na mesma direção do rio. Incrível. Ia contando as sucessivas desgraças com tamanha calma, num tom de quem relata fatos sem ter realmente participado deles. Como se não bastasse a pobreza que espiava pelos remendos da sua roupa, perdera o filhinho, o marido e ainda via pairar uma sombra sobre o segundo filho que ninava nos braços. E ali estava sem a menor revolta, confiante. Intocável. Apatia? Não, não podiam ser de uma apática aqueles olhos vivíssimos, aquelas mãos enérgicas. Inconsciência? Uma obscura irritação me fez andar.

      [...]

TELLES, Lygia Fagundes. Antes do baile verde. 7 ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1982, p. 74-76. Fragmento. 

A relação entre o que comumente se dissemina sobre o Natal e o que acontece na barca é de