1 Raras vezes na história humana, o trabalho, a riqueza,
o poder e o saber mudaram simultaneamente. Quando isso
ocorre, sobrevêm verdadeiras descontinuidades que marcam
4 época, pedras miliares no caminho da humanidade. A invenção
das técnicas para controlar o fogo, o início da agricultura e do
pastoreio na Mesopotâmia, a organização da democracia na
7 Grécia, as grandes descobertas científicas e geográficas entre
os séculos XII e XVI, o advento da sociedade industrial no
século XIX, tudo isso representa saltos de época, que
10 desorientaram gerações inteiras.
Se observarmos bem, essas ondas longas da história,
como as chamava Braudel, tornaram-se cada vez mais curtas.
13 Acabamos de nos recuperar da ultrapassagem da agricultura
pela indústria, ocorrida no século XX, e, em menos de um
século, um novo salto de época nos tomou de surpresa,
16 lançando-nos na confusão. Dessa vez o salto coincidiu com a
rápida passagem de uma sociedade de tipo industrial dominada
pelos proprietários das fábricas manufatureiras para uma
19 sociedade de tipo pós-industrial dominada pelos proprietários
dos meios de informação.
O fórceps com o qual a recém-nascida sociedade
22 pós-industrial foi extraída do ventre da sociedade industrial
anterior é representado pelo progresso científico e tecnológico,
pela globalização, pelas guerras mundiais, pelas revoluções
25 proletárias, pelo ensino universal e pelos meios de
comunicação de massa. Agindo simultaneamente, esses
fenômenos produziram uma avalanche ciclópica — talvez a
28 mais irresistível de toda a história humana — na qual nós,
contemporâneos, temos o privilégio e a desventura de estar
envolvidos em primeira pessoa.
31 Ninguém poderia ficar impassível diante de uma
mudança dessa envergadura. Por isso a sensação mais
difundida é a desorientação.
34 A nossa desorientação afeta as esferas econômica,
familiar, política, sexual, cultural... É um sintoma de
crescimento, mas é também um indício de um perigo, porque
37 quem está desorientado sente-se em crise, e quem se sente em
crise deixa de projetar o próprio futuro. Se deixarmos de
projetar nosso futuro, alguém o projetará para nós, não em
40 função de nossos interesses, mas do seu próprio proveito.
Domenico de Masi. Alfabeto da sociedade desorientada: para
entender o nosso tempo. Trad. Silvana Cobucci e Federico
Carotti. São Paulo: Objetiva, 2017, p. 93-4 (com adaptações).
Com relação às ideias do texto, julgue o item a seguir.