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Português – Interpretação – Instituto Rio Branco (Manhã/Tarde)

Simulado com questões de prova: Português – Interpretação – Instituto Rio Branco (Manhã/Tarde). Resolva online grátis, confira o gabarito e baixe o PDF!

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1Q1011013 | Português, Interpretação de Textos, Manhã e Tarde, Instituto Rio Branco, CESPE CEBRASPE, 2025

Texto associado.
Bem antes que tentassem me convencer que a data de nascimento da modernidade era um espirro cartesiano, ou então um novo interesse empírico pela natureza que transpira das páginas do Novum Organum de Bacon, ou ainda (mais tarde e mais “marxista”) a abertura dos primeiros bancos — bem antes de tudo isso, quando era rapaz, se ensinava que a modernidade começou em outubro de 1492. Nos livros da escola, o primeiro capítulo dos tempos modernos eram e são as grandes explorações. Entre estas, a viagem de Colombo ocupa um lugar muito especial. Descidas Saara adentro ou intermináveis caravanas por montes e desertos até a China de nada valiam comparadas com a aventura do genovês. Precisa ler Mediterrâneo de Fernand Braudel para conceber o alcance simbólico do pulo além de Gibraltar, não costeando, mas reto para frente. Precisa, entre outras palavras, evocar o mar Mediterrâneo — este pátio comum navegável e navegado por milênios, espécie de útero vital compartilhado — para entender por que a viagem de Colombo acabou e continua sendo uma metáfora do fim do mundo fechado, do abandono da casa materna e paterna.

Contardo Calligaris. A psicanálise e o sujeito colonial.
In: Edson L. A. Sousa (org.). Psicanálise e colonização: leituras do sintoma
social no Brasil. Porto Alegre: Artes e Ofícios, 1999, p. 11-12 (com adaptações).

Julgue o item que se segue, relativo ao texto precedente.

No texto, a região do Mediterrâneo representa o mundo fechado, como identificável, no último período do texto, no uso conotativo das expressões “útero” e “casa materna e paterna”, embora essa visão seja minimizada pela ideia transmitida por “navegável e navegado”.

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2Q1011016 | Português, Interpretação de Textos, Manhã e Tarde, Instituto Rio Branco, CESPE CEBRASPE, 2025

Texto associado.
Após as experiências históricas do século passado, na psicanálise, no estruturalismo lévi-straussiano, na semiologia e no pós-estruturalismo, não há mais plausibilidade para se pensar em um humano típico do século XIX. Um ser volitivo e racional, plenamente consciente de suas necessidades materiais e que age movido por suas decisões voluntariosas com a finalidade de atender a essas necessidades. Tudo muito coerente, porém ficcional. A pessoa que pensamos desde o final do século XX é bem diversa. Muito mais ambígua e inconsistente em seu agir no mundo, um agir reativo ao seu meio em confronto com suas vivências culturais. Atende a necessidades materiais e a “necessidades” simbólicas, isto é, a desejos. Pensamos a pessoa como um animal simbólico e desejante, uma estrutura movida por algo bem mais complexo do que aquela simples e plena consciência racional. Movimenta-se por algo que vai além de suas necessidades biológicas. O desejo abarca a necessidade.

Cada pessoa é uma entidade eminentemente simbólica, deseja por meio do simbólico. Movimenta-se por seus desejos, fala seus desejos, deseja mediante a expressão simbólica. Fala por significações desejantes. Trata-se de um ente constituído na e pela linguagem, enlaçado socialmente pela linguagem. Não uma linguagem como mera transmissão de ideias que já estariam na consciência individual. Não uma linguagem como um simples produto da mente racional e intencional que estaria meramente expressando e comunicando pensamentos que a antecedem, mas linguagem como produção, como processo de produção de ideias desejantes. Uma linguagem considerada como laço societário. Como aquilo que une um humano a outro, que os faz humanos e, assim, os torna pessoas simbólico-desejantes. São sujeitos sujeitados à linguagem. Cada pessoa fala seus desejos e se torna sujeito desses desejos que a sujeitam.

Carlos Alvarez Maia. História, ciência e linguagem: o dilema do relativismo-realismo.
Rio de Janeiro: Mauad Editora, 2015, p. 11.

Em relação às ideias e a aspectos linguísticos e textuais do texto precedente, julgue o seguinte item.

Entende-se do texto que a imagem associada ao ser humano do século XIX é essencialmente diversa da imagem associada ao ser humano desde o final do século XX, período em que ele deixa de preocupar-se com o mundo material ao seu redor.

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3Q1011018 | Português, Interpretação de Textos, Manhã e Tarde, Instituto Rio Branco, CESPE CEBRASPE, 2025

Texto associado.
Após as experiências históricas do século passado, na psicanálise, no estruturalismo lévi-straussiano, na semiologia e no pós-estruturalismo, não há mais plausibilidade para se pensar em um humano típico do século XIX. Um ser volitivo e racional, plenamente consciente de suas necessidades materiais e que age movido por suas decisões voluntariosas com a finalidade de atender a essas necessidades. Tudo muito coerente, porém ficcional. A pessoa que pensamos desde o final do século XX é bem diversa. Muito mais ambígua e inconsistente em seu agir no mundo, um agir reativo ao seu meio em confronto com suas vivências culturais. Atende a necessidades materiais e a “necessidades” simbólicas, isto é, a desejos. Pensamos a pessoa como um animal simbólico e desejante, uma estrutura movida por algo bem mais complexo do que aquela simples e plena consciência racional. Movimenta-se por algo que vai além de suas necessidades biológicas. O desejo abarca a necessidade.

Cada pessoa é uma entidade eminentemente simbólica, deseja por meio do simbólico. Movimenta-se por seus desejos, fala seus desejos, deseja mediante a expressão simbólica. Fala por significações desejantes. Trata-se de um ente constituído na e pela linguagem, enlaçado socialmente pela linguagem. Não uma linguagem como mera transmissão de ideias que já estariam na consciência individual. Não uma linguagem como um simples produto da mente racional e intencional que estaria meramente expressando e comunicando pensamentos que a antecedem, mas linguagem como produção, como processo de produção de ideias desejantes. Uma linguagem considerada como laço societário. Como aquilo que une um humano a outro, que os faz humanos e, assim, os torna pessoas simbólico-desejantes. São sujeitos sujeitados à linguagem. Cada pessoa fala seus desejos e se torna sujeito desses desejos que a sujeitam.

Carlos Alvarez Maia. História, ciência e linguagem: o dilema do relativismo-realismo.
Rio de Janeiro: Mauad Editora, 2015, p. 11.

Em relação às ideias e a aspectos linguísticos e textuais do texto precedente, julgue o seguinte item.

No texto, a linguagem é tratada como elemento com função mais abrangente que a de mera transmissão de ideias ou de expressão e comunicação de pensamentos, pois está envolvida na própria construção de desejos e pensamentos.

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4Q1011019 | Português, Interpretação de Textos, Manhã e Tarde, Instituto Rio Branco, CESPE CEBRASPE, 2025

Texto associado.
Após as experiências históricas do século passado, na psicanálise, no estruturalismo lévi-straussiano, na semiologia e no pós-estruturalismo, não há mais plausibilidade para se pensar em um humano típico do século XIX. Um ser volitivo e racional, plenamente consciente de suas necessidades materiais e que age movido por suas decisões voluntariosas com a finalidade de atender a essas necessidades. Tudo muito coerente, porém ficcional. A pessoa que pensamos desde o final do século XX é bem diversa. Muito mais ambígua e inconsistente em seu agir no mundo, um agir reativo ao seu meio em confronto com suas vivências culturais. Atende a necessidades materiais e a “necessidades” simbólicas, isto é, a desejos. Pensamos a pessoa como um animal simbólico e desejante, uma estrutura movida por algo bem mais complexo do que aquela simples e plena consciência racional. Movimenta-se por algo que vai além de suas necessidades biológicas. O desejo abarca a necessidade.

Cada pessoa é uma entidade eminentemente simbólica, deseja por meio do simbólico. Movimenta-se por seus desejos, fala seus desejos, deseja mediante a expressão simbólica. Fala por significações desejantes. Trata-se de um ente constituído na e pela linguagem, enlaçado socialmente pela linguagem. Não uma linguagem como mera transmissão de ideias que já estariam na consciência individual. Não uma linguagem como um simples produto da mente racional e intencional que estaria meramente expressando e comunicando pensamentos que a antecedem, mas linguagem como produção, como processo de produção de ideias desejantes. Uma linguagem considerada como laço societário. Como aquilo que une um humano a outro, que os faz humanos e, assim, os torna pessoas simbólico-desejantes. São sujeitos sujeitados à linguagem. Cada pessoa fala seus desejos e se torna sujeito desses desejos que a sujeitam.

Carlos Alvarez Maia. História, ciência e linguagem: o dilema do relativismo-realismo.
Rio de Janeiro: Mauad Editora, 2015, p. 11.

Em relação às ideias e a aspectos linguísticos e textuais do texto precedente, julgue o seguinte item.


No último período do texto, o autor enfatiza a capacidade que tem o ser humano de expressar o objeto de seu desejo e destaca como esse seu desejo o aprisiona.

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5Q1011020 | Português, Interpretação de Textos, Manhã e Tarde, Instituto Rio Branco, CESPE CEBRASPE, 2025

Texto associado.
Após as experiências históricas do século passado, na psicanálise, no estruturalismo lévi-straussiano, na semiologia e no pós-estruturalismo, não há mais plausibilidade para se pensar em um humano típico do século XIX. Um ser volitivo e racional, plenamente consciente de suas necessidades materiais e que age movido por suas decisões voluntariosas com a finalidade de atender a essas necessidades. Tudo muito coerente, porém ficcional. A pessoa que pensamos desde o final do século XX é bem diversa. Muito mais ambígua e inconsistente em seu agir no mundo, um agir reativo ao seu meio em confronto com suas vivências culturais. Atende a necessidades materiais e a “necessidades” simbólicas, isto é, a desejos. Pensamos a pessoa como um animal simbólico e desejante, uma estrutura movida por algo bem mais complexo do que aquela simples e plena consciência racional. Movimenta-se por algo que vai além de suas necessidades biológicas. O desejo abarca a necessidade.

Cada pessoa é uma entidade eminentemente simbólica, deseja por meio do simbólico. Movimenta-se por seus desejos, fala seus desejos, deseja mediante a expressão simbólica. Fala por significações desejantes. Trata-se de um ente constituído na e pela linguagem, enlaçado socialmente pela linguagem. Não uma linguagem como mera transmissão de ideias que já estariam na consciência individual. Não uma linguagem como um simples produto da mente racional e intencional que estaria meramente expressando e comunicando pensamentos que a antecedem, mas linguagem como produção, como processo de produção de ideias desejantes. Uma linguagem considerada como laço societário. Como aquilo que une um humano a outro, que os faz humanos e, assim, os torna pessoas simbólico-desejantes. São sujeitos sujeitados à linguagem. Cada pessoa fala seus desejos e se torna sujeito desses desejos que a sujeitam.

Carlos Alvarez Maia. História, ciência e linguagem: o dilema do relativismo-realismo.
Rio de Janeiro: Mauad Editora, 2015, p. 11.

Em relação às ideias e a aspectos linguísticos e textuais do texto precedente, julgue o seguinte item.


No quinto e sexto períodos do segundo parágrafo, a repetição do trecho “Não uma linguagem como” é recurso usado para reforçar que a linguagem de um ente “enlaçado socialmente pela linguagem” (quarto período do segundo parágrafo) é diferente da linguagem do homem “que age movido por suas decisões voluntariosas com a finalidade de atender a essas necessidades”, mencionado no segundo período do primeiro parágrafo.

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6Q1011021 | Português, Interpretação de Textos, Manhã e Tarde, Instituto Rio Branco, CESPE CEBRASPE, 2025

Texto associado.
1888

9 de janeiro

Ora bem, faz hoje um ano que voltei definitivamente da Europa. O que me lembrou esta data foi, estando a beber café, o pregão de um vendedor de vassouras e espanadores: “Vai vassouras! vai espanadores!”. Costumo ouvi-lo outras manhãs, mas desta vez trouxe-me à memória o dia do desembarque, quando cheguei aposentado à minha terra, ao meu Catete, à minha língua. Era o mesmo que ouvi há um ano, em 1887, e talvez fosse a mesma boca. Durante os meus trinta e tantos anos de diplomacia algumas vezes vim ao Brasil, com licença. O mais do tempo vivi fora, em várias partes, e não foi pouco. Cuidei que não acabaria de me habituar novamente a esta outra vida de cá. Pois acabei. Certamente ainda me lembram coisas e pessoas de longe, diversões, paisagens, costumes, mas não morro de saudades por nada. Aqui estou, aqui vivo, aqui morrerei.

Machado de Assis. Memorial de Aires. In: Aluizio Leite, Ana Lima Cecília,
Heloisa Jahn, Rodrigo Lacerda (org.). Machado de Assis: obra completa
em quatro volumes, v. 1. São Paulo: Nova Aguilar, 2015, p.1.197.

Julgue o item seguinte, com base no texto precedente.

A expressão “a mesma boca” (quarto período) desfaz a ambiguidade quanto ao referente do pronome átono em “Costumo ouvi-lo outras manhãs” (terceiro período) e da expressão “o mesmo” em “o mesmo que ouvi há um ano” (quarto período) — que pode ser interpretado como “o pregão” ou “um vendedor de vassouras e espanadores” (ambos no segundo período).

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7Q1011023 | Português, Interpretação de Textos, Manhã e Tarde, Instituto Rio Branco, CESPE CEBRASPE, 2025

Texto associado.
1888

9 de janeiro

Ora bem, faz hoje um ano que voltei definitivamente da Europa. O que me lembrou esta data foi, estando a beber café, o pregão de um vendedor de vassouras e espanadores: “Vai vassouras! vai espanadores!”. Costumo ouvi-lo outras manhãs, mas desta vez trouxe-me à memória o dia do desembarque, quando cheguei aposentado à minha terra, ao meu Catete, à minha língua. Era o mesmo que ouvi há um ano, em 1887, e talvez fosse a mesma boca. Durante os meus trinta e tantos anos de diplomacia algumas vezes vim ao Brasil, com licença. O mais do tempo vivi fora, em várias partes, e não foi pouco. Cuidei que não acabaria de me habituar novamente a esta outra vida de cá. Pois acabei. Certamente ainda me lembram coisas e pessoas de longe, diversões, paisagens, costumes, mas não morro de saudades por nada. Aqui estou, aqui vivo, aqui morrerei.

Machado de Assis. Memorial de Aires. In: Aluizio Leite, Ana Lima Cecília,
Heloisa Jahn, Rodrigo Lacerda (org.). Machado de Assis: obra completa
em quatro volumes, v. 1. São Paulo: Nova Aguilar, 2015, p.1.197.

Julgue o item seguinte, com base no texto precedente.

O “vendedor de vassouras e espanadores” (segundo período) é personagem que compõe o campo semântico estabelecido pelo narrador em “minha terra (...) meu Catete (...) minha língua” (terceiro período).

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8Q1011024 | Português, Interpretação de Textos, Manhã e Tarde, Instituto Rio Branco, CESPE CEBRASPE, 2025

Texto associado.
1888

9 de janeiro

Ora bem, faz hoje um ano que voltei definitivamente da Europa. O que me lembrou esta data foi, estando a beber café, o pregão de um vendedor de vassouras e espanadores: “Vai vassouras! vai espanadores!”. Costumo ouvi-lo outras manhãs, mas desta vez trouxe-me à memória o dia do desembarque, quando cheguei aposentado à minha terra, ao meu Catete, à minha língua. Era o mesmo que ouvi há um ano, em 1887, e talvez fosse a mesma boca. Durante os meus trinta e tantos anos de diplomacia algumas vezes vim ao Brasil, com licença. O mais do tempo vivi fora, em várias partes, e não foi pouco. Cuidei que não acabaria de me habituar novamente a esta outra vida de cá. Pois acabei. Certamente ainda me lembram coisas e pessoas de longe, diversões, paisagens, costumes, mas não morro de saudades por nada. Aqui estou, aqui vivo, aqui morrerei.

Machado de Assis. Memorial de Aires. In: Aluizio Leite, Ana Lima Cecília,
Heloisa Jahn, Rodrigo Lacerda (org.). Machado de Assis: obra completa
em quatro volumes, v. 1. São Paulo: Nova Aguilar, 2015, p.1.197.

Julgue o item seguinte, com base no texto precedente.

Pelas relações de sentido estabelecidas no texto, percebe-se uma noção de oposição entre os períodos no seguinte trecho: “Cuidei que não acabaria de me habituar novamente a esta outra vida de cá. Pois acabei.” (sétimo e oitavo períodos).

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9Q1011025 | Português, Interpretação de Textos, Manhã e Tarde, Instituto Rio Branco, CESPE CEBRASPE, 2025

Texto associado.
1888

9 de janeiro

Ora bem, faz hoje um ano que voltei definitivamente da Europa. O que me lembrou esta data foi, estando a beber café, o pregão de um vendedor de vassouras e espanadores: “Vai vassouras! vai espanadores!”. Costumo ouvi-lo outras manhãs, mas desta vez trouxe-me à memória o dia do desembarque, quando cheguei aposentado à minha terra, ao meu Catete, à minha língua. Era o mesmo que ouvi há um ano, em 1887, e talvez fosse a mesma boca. Durante os meus trinta e tantos anos de diplomacia algumas vezes vim ao Brasil, com licença. O mais do tempo vivi fora, em várias partes, e não foi pouco. Cuidei que não acabaria de me habituar novamente a esta outra vida de cá. Pois acabei. Certamente ainda me lembram coisas e pessoas de longe, diversões, paisagens, costumes, mas não morro de saudades por nada. Aqui estou, aqui vivo, aqui morrerei.

Machado de Assis. Memorial de Aires. In: Aluizio Leite, Ana Lima Cecília,
Heloisa Jahn, Rodrigo Lacerda (org.). Machado de Assis: obra completa
em quatro volumes, v. 1. São Paulo: Nova Aguilar, 2015, p.1.197.

Julgue o item seguinte, com base no texto precedente.

Segundo o narrador, a língua por ele falada é elemento acolhedor que reforça seus laços com a “outra vida de cá”, da qual não morria de saudades enquanto exercia a diplomacia em terras “de longe”.

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10Q1011026 | Português, Interpretação de Textos, Manhã e Tarde, Instituto Rio Branco, CESPE CEBRASPE, 2025

Texto associado.
1888

9 de janeiro

Ora bem, faz hoje um ano que voltei definitivamente da Europa. O que me lembrou esta data foi, estando a beber café, o pregão de um vendedor de vassouras e espanadores: “Vai vassouras! vai espanadores!”. Costumo ouvi-lo outras manhãs, mas desta vez trouxe-me à memória o dia do desembarque, quando cheguei aposentado à minha terra, ao meu Catete, à minha língua. Era o mesmo que ouvi há um ano, em 1887, e talvez fosse a mesma boca. Durante os meus trinta e tantos anos de diplomacia algumas vezes vim ao Brasil, com licença. O mais do tempo vivi fora, em várias partes, e não foi pouco. Cuidei que não acabaria de me habituar novamente a esta outra vida de cá. Pois acabei. Certamente ainda me lembram coisas e pessoas de longe, diversões, paisagens, costumes, mas não morro de saudades por nada. Aqui estou, aqui vivo, aqui morrerei.

Machado de Assis. Memorial de Aires. In: Aluizio Leite, Ana Lima Cecília,
Heloisa Jahn, Rodrigo Lacerda (org.). Machado de Assis: obra completa
em quatro volumes, v. 1. São Paulo: Nova Aguilar, 2015, p.1.197.

Julgue o item seguinte, com base no texto precedente.

A relação entre Europa e Brasil apresentada no texto pela experiência diplomática do narrador distancia-se da dialética formativa da literatura e do povo brasileiro: cosmopolitismo e localismo.

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11Q1011027 | Português, Interpretação de Textos, Manhã e Tarde, Instituto Rio Branco, CESPE CEBRASPE, 2025

Texto associado.
1888

9 de janeiro

Ora bem, faz hoje um ano que voltei definitivamente da Europa. O que me lembrou esta data foi, estando a beber café, o pregão de um vendedor de vassouras e espanadores: “Vai vassouras! vai espanadores!”. Costumo ouvi-lo outras manhãs, mas desta vez trouxe-me à memória o dia do desembarque, quando cheguei aposentado à minha terra, ao meu Catete, à minha língua. Era o mesmo que ouvi há um ano, em 1887, e talvez fosse a mesma boca. Durante os meus trinta e tantos anos de diplomacia algumas vezes vim ao Brasil, com licença. O mais do tempo vivi fora, em várias partes, e não foi pouco. Cuidei que não acabaria de me habituar novamente a esta outra vida de cá. Pois acabei. Certamente ainda me lembram coisas e pessoas de longe, diversões, paisagens, costumes, mas não morro de saudades por nada. Aqui estou, aqui vivo, aqui morrerei.

Machado de Assis. Memorial de Aires. In: Aluizio Leite, Ana Lima Cecília,
Heloisa Jahn, Rodrigo Lacerda (org.). Machado de Assis: obra completa
em quatro volumes, v. 1. São Paulo: Nova Aguilar, 2015, p.1.197.

Julgue o item seguinte, com base no texto precedente.

Na sequência narrativa “Aqui estou, aqui vivo, aqui morrerei” (último período), identifica-se uma progressão temática referenciada espacialmente.

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12Q1011028 | Português, Interpretação de Textos, Manhã e Tarde, Instituto Rio Branco, CESPE CEBRASPE, 2025

Texto associado.
(Cannes – 31 – maio – 1952)

Em abril de 1952 embrenhei-me numa aventura singular: fui a Moscou e a outros lugares medonhos situados além da cortina de ferro exposta com vigor pela civilização cristã e ocidental. Nunca imaginei que tal coisa pudesse acontecer a um homem sedentário, resignado ao ônibus e ao bonde quando o movimento era indispensável. Absurda semelhante viagem — e quando me trataram dela, quase me zanguei. Faltavam-me recursos para realizá-la; a experiência me afirmava que não me deixariam sair do Brasil; e, para falar com franqueza, não me sentia disposto a mexer-me, abandonar a toca onde vivo. Recusei, pois, o convite, divagação insensata, julguei. Tudo aquilo era impossível. Mas uma série de acasos transformou a impossibilidade em dificuldade; esta se aplainou sem que eu tivesse feito o mínimo esforço, e achei-me em condições de percorrer terras estranhas, as malas arrumadas, os papéis em ordem, com todos os selos e carimbos. Depois de andar por cima de vários estados do meu país, tinha-me resolvido a não entrar em aviões: a morte horrível de um amigo levara-me a odiar esses aparelhos assassinos. Meses atrás, para ir a um congresso em Porto Alegre, rolara nove dias em automóvel. Tenho horror às casas desconhecidas. E falo pessimamente duas línguas estrangeiras. Estava decidido a não viajar; e, em consequência da firme decisão, encontrei-me um dia metido na encrenca voadora, o cinto amarrado, os cigarros inúteis, em obediência ao letreiro exigente aceso à porta da cabina.

Graciliano Ramos. Viagem (Checoslováquia — URSS).
Rio de Janeiro: José Olympio, 2022, p. 9-10 (com adaptações).

A respeito do texto precedente e de seus aspectos linguísticos e literários, julgue o item a seguir.

Ao contar sua experiência passada, o autor do texto julga ter sido “insensata” sua recusa ao convite de viajar, por sua viagem ter-se provado agradável e auspiciosa, como se entende da leitura do segundo período do texto.

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13Q1011033 | Português, Interpretação de Textos, Manhã e Tarde, Instituto Rio Branco, CESPE CEBRASPE, 2025

Texto associado.
(Cannes – 31 – maio – 1952)

Em abril de 1952 embrenhei-me numa aventura singular: fui a Moscou e a outros lugares medonhos situados além da cortina de ferro exposta com vigor pela civilização cristã e ocidental. Nunca imaginei que tal coisa pudesse acontecer a um homem sedentário, resignado ao ônibus e ao bonde quando o movimento era indispensável. Absurda semelhante viagem — e quando me trataram dela, quase me zanguei. Faltavam-me recursos para realizá-la; a experiência me afirmava que não me deixariam sair do Brasil; e, para falar com franqueza, não me sentia disposto a mexer-me, abandonar a toca onde vivo. Recusei, pois, o convite, divagação insensata, julguei. Tudo aquilo era impossível. Mas uma série de acasos transformou a impossibilidade em dificuldade; esta se aplainou sem que eu tivesse feito o mínimo esforço, e achei-me em condições de percorrer terras estranhas, as malas arrumadas, os papéis em ordem, com todos os selos e carimbos. Depois de andar por cima de vários estados do meu país, tinha-me resolvido a não entrar em aviões: a morte horrível de um amigo levara-me a odiar esses aparelhos assassinos. Meses atrás, para ir a um congresso em Porto Alegre, rolara nove dias em automóvel. Tenho horror às casas desconhecidas. E falo pessimamente duas línguas estrangeiras. Estava decidido a não viajar; e, em consequência da firme decisão, encontrei-me um dia metido na encrenca voadora, o cinto amarrado, os cigarros inúteis, em obediência ao letreiro exigente aceso à porta da cabina.

Graciliano Ramos. Viagem (Checoslováquia — URSS).
Rio de Janeiro: José Olympio, 2022, p. 9-10 (com adaptações).

A respeito do texto precedente e de seus aspectos linguísticos e literários, julgue o item a seguir.

No sétimo período, há uma progressão gradual de acontecimentos que culminaram na “aventura singular” vivida pelo narrador e que é objeto de seu texto.

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14Q1011035 | Português, Interpretação de Textos, Manhã e Tarde, Instituto Rio Branco, CESPE CEBRASPE, 2025

Texto associado.
No Itamaraty, em dependência do Serviço de Informações, opera autônoma e praticamente sem cessar o telex, espécie de bem-mandada máquina, que tiquetaqueia recebendo notícias diretas radiotelegráficas. Naquela tarde de 22 de novembro de 1963, passando por ali meu amigo o Ministro Portella, perguntou-lhe um subalterno de olhos espantados: que queria dizer “shot” em inglês? A tremenda coisa, no instante, anunciava-se já completa, ainda quente, frases e palavras golpeadas na longa tira de papel que ia adiante desenrolando-se. “Presidente Kennedy...” Susto e consternação confundiam depressa a cidade, os países, todo-o-mundo lívido. Antes que tudo, o assombro. Era uma das vezes em que, enorme, o que devia não ser possível sucede, o desproporcionado. Lembro-me que me volveram à mente outras sortes e mortes. E — por que então — a de Gandhi. Tende-se a supor que esses seres extraordinários, em fino evoluídos, almas altas, estariam além do alcanço de grosseiros desfechos. Quando, ao que parece, são, virtualmente, os que de preferência os chamam; talvez por fato de polarização, o positivo provocando sempre o negativo. De exformes zonas inferiores, onde se atrasa o Mal, medonhantes braços estariam armando a atingir o luminoso. Apenas os detêm permanentes defesas de ordem sutil; mas que, se só um momento cessam de prevalecer, permitem o inominável. Para nós a Providência é incompreendida computadora.

João Guimarães Rosa. Os abismos e os astros. In: Ave, palavra.
Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2009, p. 69-70.

Com base no texto precedente, julgue o item subsequente.

No terceiro período, “A tremenda coisa” se refere à grande velocidade e força dos golpes dados na geração das frases e palavras pelo telex.

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15Q1011037 | Português, Interpretação de Textos, Manhã e Tarde, Instituto Rio Branco, CESPE CEBRASPE, 2025

Texto associado.
No Itamaraty, em dependência do Serviço de Informações, opera autônoma e praticamente sem cessar o telex, espécie de bem-mandada máquina, que tiquetaqueia recebendo notícias diretas radiotelegráficas. Naquela tarde de 22 de novembro de 1963, passando por ali meu amigo o Ministro Portella, perguntou-lhe um subalterno de olhos espantados: que queria dizer “shot” em inglês? A tremenda coisa, no instante, anunciava-se já completa, ainda quente, frases e palavras golpeadas na longa tira de papel que ia adiante desenrolando-se. “Presidente Kennedy...” Susto e consternação confundiam depressa a cidade, os países, todo-o-mundo lívido. Antes que tudo, o assombro. Era uma das vezes em que, enorme, o que devia não ser possível sucede, o desproporcionado. Lembro-me que me volveram à mente outras sortes e mortes. E — por que então — a de Gandhi. Tende-se a supor que esses seres extraordinários, em fino evoluídos, almas altas, estariam além do alcanço de grosseiros desfechos. Quando, ao que parece, são, virtualmente, os que de preferência os chamam; talvez por fato de polarização, o positivo provocando sempre o negativo. De exformes zonas inferiores, onde se atrasa o Mal, medonhantes braços estariam armando a atingir o luminoso. Apenas os detêm permanentes defesas de ordem sutil; mas que, se só um momento cessam de prevalecer, permitem o inominável. Para nós a Providência é incompreendida computadora.

João Guimarães Rosa. Os abismos e os astros. In: Ave, palavra.
Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2009, p. 69-70.

Com base no texto precedente, julgue o item subsequente.

A contraposição estabelecida no texto entre “espécie de bem-mandada máquina”, no primeiro período, e “a Providência é incompreendida computadora”, no último período, revela uma contradição em torno da autonomia dos seres humanos.

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16Q1011038 | Português, Interpretação de Textos, Manhã e Tarde, Instituto Rio Branco, CESPE CEBRASPE, 2025

Texto associado.
No Itamaraty, em dependência do Serviço de Informações, opera autônoma e praticamente sem cessar o telex, espécie de bem-mandada máquina, que tiquetaqueia recebendo notícias diretas radiotelegráficas. Naquela tarde de 22 de novembro de 1963, passando por ali meu amigo o Ministro Portella, perguntou-lhe um subalterno de olhos espantados: que queria dizer “shot” em inglês? A tremenda coisa, no instante, anunciava-se já completa, ainda quente, frases e palavras golpeadas na longa tira de papel que ia adiante desenrolando-se. “Presidente Kennedy...” Susto e consternação confundiam depressa a cidade, os países, todo-o-mundo lívido. Antes que tudo, o assombro. Era uma das vezes em que, enorme, o que devia não ser possível sucede, o desproporcionado. Lembro-me que me volveram à mente outras sortes e mortes. E — por que então — a de Gandhi. Tende-se a supor que esses seres extraordinários, em fino evoluídos, almas altas, estariam além do alcanço de grosseiros desfechos. Quando, ao que parece, são, virtualmente, os que de preferência os chamam; talvez por fato de polarização, o positivo provocando sempre o negativo. De exformes zonas inferiores, onde se atrasa o Mal, medonhantes braços estariam armando a atingir o luminoso. Apenas os detêm permanentes defesas de ordem sutil; mas que, se só um momento cessam de prevalecer, permitem o inominável. Para nós a Providência é incompreendida computadora.

João Guimarães Rosa. Os abismos e os astros. In: Ave, palavra.
Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2009, p. 69-70.

Com base no texto precedente, julgue o item subsequente.

As reticências em “Presidente Kennedy...” indicam que a mensagem recebida pelo telex não foi comunicada com a clareza necessária e, por essa razão, confundia os destinatários.

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17Q1011041 | Português, Interpretação de Textos, Manhã e Tarde, Instituto Rio Branco, CESPE CEBRASPE, 2025

Texto associado.
No Itamaraty, em dependência do Serviço de Informações, opera autônoma e praticamente sem cessar o telex, espécie de bem-mandada máquina, que tiquetaqueia recebendo notícias diretas radiotelegráficas. Naquela tarde de 22 de novembro de 1963, passando por ali meu amigo o Ministro Portella, perguntou-lhe um subalterno de olhos espantados: que queria dizer “shot” em inglês? A tremenda coisa, no instante, anunciava-se já completa, ainda quente, frases e palavras golpeadas na longa tira de papel que ia adiante desenrolando-se. “Presidente Kennedy...” Susto e consternação confundiam depressa a cidade, os países, todo-o-mundo lívido. Antes que tudo, o assombro. Era uma das vezes em que, enorme, o que devia não ser possível sucede, o desproporcionado. Lembro-me que me volveram à mente outras sortes e mortes. E — por que então — a de Gandhi. Tende-se a supor que esses seres extraordinários, em fino evoluídos, almas altas, estariam além do alcanço de grosseiros desfechos. Quando, ao que parece, são, virtualmente, os que de preferência os chamam; talvez por fato de polarização, o positivo provocando sempre o negativo. De exformes zonas inferiores, onde se atrasa o Mal, medonhantes braços estariam armando a atingir o luminoso. Apenas os detêm permanentes defesas de ordem sutil; mas que, se só um momento cessam de prevalecer, permitem o inominável. Para nós a Providência é incompreendida computadora.

João Guimarães Rosa. Os abismos e os astros. In: Ave, palavra.
Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2009, p. 69-70.

Com base no texto precedente, julgue o item subsequente.

A forma pronominal empregada em “os chamam”, no período “Quando, ao que parece, são, virtualmente, os que de preferência os chamam; talvez por fato de polarização, o positivo provocando sempre o negativo”, se refere a pessoas como Kennedy e Gandhi, que, segundo o narrador, estão sujeitas a “grosseiros desfechos”.

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18Q1011042 | Português, Interpretação de Textos, Manhã e Tarde, Instituto Rio Branco, CESPE CEBRASPE, 2025

Texto associado.
Há oito anos Antonio Candido nos deixou — ou pareceu deixar. No entanto, há ausências que pesam como presenças. Sua crítica continua agindo. Candido não saiu: se transformou em método, em escuta, em atenção. Em compromisso com o que ainda falta realizar. Na sua escrita não havia medo do Brasil. Havia enfrentamento. O país das desigualdades, das injunções coloniais, da dor transformada em paisagem — esse país era objeto de estudo, mas também de lamento e de luta. A crítica não era neutralidade, era trincheira. E a literatura, longe de ser luxo, era direito: o direito de experimentar o mundo para além do necessário. O direito ao supérfluo que nos humaniza. Contudo, sua grandeza não vinha só daquilo que dizia, mas de como dizia. Candido via a literatura como um fenômeno enraizado nas condições concretas da vida, mas dotado de autonomia relativa e complexidade formal. Nenhum arroubo de vaidade, nenhuma fome de autoridade. Só o ensaio, como forma tateante de pensar. Uma crítica que girava em torno do objeto, que o rodeava até que ele se revelasse por suas fissuras. Nada de fórmulas prontas, nenhuma teoria imposta como camisa de força. Apenas a disposição de escutar os textos como quem escuta um povo. Sua dialética não era ostentação, mas prática silenciosa. Estava no gesto de alternar os polos — local e universal, ordem e desordem, cultura e barbarização — não para conciliá-los, mas para mostrar que é da fricção que nasce a forma. Pensar dialeticamente, para ele, era recusar as falsas harmonias. Era compreender que os contrários não se anulam: se atravessam, se transformam, se disputam. Sua crítica era uma coreografia do conflito — um modo de pensar o Brasil sem amputar suas tensões constitutivas. Uma dialética de baixa voz, mas de alta potência. Candido não nos deu respostas. Nos deu um modo de perguntar. E é esse modo — lúcido, sereno, apaixonado — que nos falta. Não como ausência melancólica, mas como horizonte possível.

Gabriel Teles. Antonio Candido: oito anos de uma ausência presente.
In: Le Monde Diplomatique Brasil, ed. 216, maio/2025.

Julgue o item seguinte, com base no texto precedente.

Embora o texto não seja literário, sua estrutura textual, construída com períodos curtos e imagens contundentes, evidencia a intenção do autor em explorar a sensibilidade estética.

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19Q1011043 | Português, Interpretação de Textos, Manhã e Tarde, Instituto Rio Branco, CESPE CEBRASPE, 2025

Texto associado.
Há oito anos Antonio Candido nos deixou — ou pareceu deixar. No entanto, há ausências que pesam como presenças. Sua crítica continua agindo. Candido não saiu: se transformou em método, em escuta, em atenção. Em compromisso com o que ainda falta realizar. Na sua escrita não havia medo do Brasil. Havia enfrentamento. O país das desigualdades, das injunções coloniais, da dor transformada em paisagem — esse país era objeto de estudo, mas também de lamento e de luta. A crítica não era neutralidade, era trincheira. E a literatura, longe de ser luxo, era direito: o direito de experimentar o mundo para além do necessário. O direito ao supérfluo que nos humaniza. Contudo, sua grandeza não vinha só daquilo que dizia, mas de como dizia. Candido via a literatura como um fenômeno enraizado nas condições concretas da vida, mas dotado de autonomia relativa e complexidade formal. Nenhum arroubo de vaidade, nenhuma fome de autoridade. Só o ensaio, como forma tateante de pensar. Uma crítica que girava em torno do objeto, que o rodeava até que ele se revelasse por suas fissuras. Nada de fórmulas prontas, nenhuma teoria imposta como camisa de força. Apenas a disposição de escutar os textos como quem escuta um povo. Sua dialética não era ostentação, mas prática silenciosa. Estava no gesto de alternar os polos — local e universal, ordem e desordem, cultura e barbarização — não para conciliá-los, mas para mostrar que é da fricção que nasce a forma. Pensar dialeticamente, para ele, era recusar as falsas harmonias. Era compreender que os contrários não se anulam: se atravessam, se transformam, se disputam. Sua crítica era uma coreografia do conflito — um modo de pensar o Brasil sem amputar suas tensões constitutivas. Uma dialética de baixa voz, mas de alta potência. Candido não nos deu respostas. Nos deu um modo de perguntar. E é esse modo — lúcido, sereno, apaixonado — que nos falta. Não como ausência melancólica, mas como horizonte possível.

Gabriel Teles. Antonio Candido: oito anos de uma ausência presente.
In: Le Monde Diplomatique Brasil, ed. 216, maio/2025.

Julgue o item seguinte, com base no texto precedente.

Ao definir a crítica de Antonio Candido como “enfrentamento”, “trincheira” e “coreografia do conflito”, o autor evidencia o caráter engajado e sociológico desse trabalho crítico, em função da opção de Candido por dar centralidade ao conteúdo em detrimento da forma literária.

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20Q1011045 | Português, Interpretação de Textos, Manhã e Tarde, Instituto Rio Branco, CESPE CEBRASPE, 2025

Texto associado.
Há oito anos Antonio Candido nos deixou — ou pareceu deixar. No entanto, há ausências que pesam como presenças. Sua crítica continua agindo. Candido não saiu: se transformou em método, em escuta, em atenção. Em compromisso com o que ainda falta realizar. Na sua escrita não havia medo do Brasil. Havia enfrentamento. O país das desigualdades, das injunções coloniais, da dor transformada em paisagem — esse país era objeto de estudo, mas também de lamento e de luta. A crítica não era neutralidade, era trincheira. E a literatura, longe de ser luxo, era direito: o direito de experimentar o mundo para além do necessário. O direito ao supérfluo que nos humaniza. Contudo, sua grandeza não vinha só daquilo que dizia, mas de como dizia. Candido via a literatura como um fenômeno enraizado nas condições concretas da vida, mas dotado de autonomia relativa e complexidade formal. Nenhum arroubo de vaidade, nenhuma fome de autoridade. Só o ensaio, como forma tateante de pensar. Uma crítica que girava em torno do objeto, que o rodeava até que ele se revelasse por suas fissuras. Nada de fórmulas prontas, nenhuma teoria imposta como camisa de força. Apenas a disposição de escutar os textos como quem escuta um povo. Sua dialética não era ostentação, mas prática silenciosa. Estava no gesto de alternar os polos — local e universal, ordem e desordem, cultura e barbarização — não para conciliá-los, mas para mostrar que é da fricção que nasce a forma. Pensar dialeticamente, para ele, era recusar as falsas harmonias. Era compreender que os contrários não se anulam: se atravessam, se transformam, se disputam. Sua crítica era uma coreografia do conflito — um modo de pensar o Brasil sem amputar suas tensões constitutivas. Uma dialética de baixa voz, mas de alta potência. Candido não nos deu respostas. Nos deu um modo de perguntar. E é esse modo — lúcido, sereno, apaixonado — que nos falta. Não como ausência melancólica, mas como horizonte possível.

Gabriel Teles. Antonio Candido: oito anos de uma ausência presente.
In: Le Monde Diplomatique Brasil, ed. 216, maio/2025.

Julgue o item seguinte, com base no texto precedente.

Em “Só o ensaio, como forma tateante de pensar” (décimo quinto período), o autor expõe um dos limites do trabalho crítico de Antonio Candido, que, ao submeter a perspectiva crítica ao objeto de análise, impossibilitava a adoção de uma fundamentação teórica coerente, o que o impedia de dar respostas a seu leitor.

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