O grande hall do hotel estava repleto. [...] Os criados
passavam apressados, erguendo numa azáfama os pratos
de metal. Ao alto, os ventiladores faziam um rumor
de colmeias. Senhoras e cavalheiros, perfeitamente felizes,
as senhoras quase todas com largos boás de plumas brancas,
chalravam e sorriam. Estávamos bem na bizarra sociedade
de entalhe que é o escol dos hotéis. Alta, longa, comprida,
com uma cintura de esmaltes translúcidos e o ar empoado
de uma íntima do general Lafayette, a escritora americana
cuja admiração por Gonçalves Dias chegara a fazê-la
estudar e propagar o Brasil, mastigava gravemente. Logo
ao lado, um grupo de engenheiros, também americanos,
bebia, com gargalhadas brutais e decerto inconvenientes,
champanhe Mumm. [...] De vez em quando parava à porta
um novo hóspede, hesitava, percorria com o olhar a extensa
fila de mesas onde o debinage se acalorava. A um canto,
Mlles. Peres, filhas de um rico argentino, yatch-recorderman
nas horas vagas e vendedor de gado nas outras, perlavam
risadinhas de flerte para o solitário e divino Alberto Guerra,
seguro dos seus bíceps, dos seus brilhantes e quiçá dos
seus versos.
JOÃO DO RIO. Dentro da noite. São Paulo: Antiqua, 2002 (fragmento). Nessa descrição, o narrador traça um panorama
sociocultural das primeiras décadas do século XX.
Sua perspectiva revela uma
✂️ a) percepção irônica da importação de valores e
modismos. ✂️ b) euforia generalizada com as facilidades da
modernidade. ✂️ c) visão otimista sobre as atitudes da mulher
emancipada. ✂️ d) adesão propagandística aos gostos burgueses
e ao luxo. ✂️ e) preocupação nacionalista com a integridade da
língua.