Quem não se recorda de Aurélia Camargo, que
atravessou o firmamento da corte como brilhante meteoro, e apagou-se de repente no meio do deslumbramento que
produzira seu fulgor? Tinha ela dezoito anos quando
apareceu a primeira vez na sociedade. Não a conheciam;
e logo buscaram todos com avidez informações acerca
da grande novidade do dia. Dizia-se muita coisa que não
repetirei agora, pois a seu tempo saberemos a verdade,
sem os comentos malévolos de que usam vesti-la os
noveleiros. Aurélia era órfã; tinha em sua companhia
uma velha parenta, viúva, D. Firmina Mascarenhas, que
sempre a acompanhava na sociedade. Mas essa parenta
não passava de mãe de encomenda, para condescender
com os escrúpulos da sociedade brasileira, que naquele
tempo não tinha admitido ainda certa emancipação
feminina. Guardando com a viúva as deferências devidas
à idade, a moça não declinava um instante do firme propósito de governar sua casa e dirigir suas ações como
entendesse. Constava também que Aurélia tinha um
tutor; mas essa entidade era desconhecida, a julgar pelo
caráter da pupila, não devia exercer maior influência em sua vontade, do que a velha parenta.
ALENCAR, J. Senhora . São Paulo: Ática, 2006.
O romance Senhora , de José de Alencar, foi publicado em
1875. No fragmento transcrito, a presença de D. Firmina Mascarenhas como "parenta" de Aurélia Camargo assimila práticas e convenções sociais inseridas no contexto do
Romantismo, pois
✂️ a) o trabalho ficcional do narrador desvaloriza a mulher ao retratar a condição feminina na sociedade brasileira
da época. ✂️ b) o trabalho ficcional do narrador mascara os hábitos sociais no enredo de seu romance. ✂️ c) as características da sociedade em que Aurélia
vivia são remodeladas na imaginação do narrador
romântico. ✂️ d) o narrador evidencia o cerceamento sexista à
autoridade da mulher, financeiramente independente. ✂️ e) o narrador incorporou em sua ficção hábitos muito avançados para a sociedade daquele período
histórico.