Texto associado. E Sofia? interroga impaciente a leitora, tal qual Orgon: Et Tartufe? Ai, amiga minha, a resposta é naturalmente a mesma, – também ela comia bem, dormia largo e fofo, – coisas que, aliás, não impedem que uma pessoa ame, quando quer amar. Se esta última reflexão é o motivo secreto da vossa pergunta, deixai que vos diga que sois muito indiscreta, e que eu não me quero senão com dissimulados.
Repito, comia bem, dormia largo e fofo. Chegara ao fim da comissão das Alagoas, com elogios da imprensa; a Atalaia chamou‐lhe “o anjo da consolação”. E não se pense que este nome a alegrou, posto que a lisonjeasse; ao contrário, resumindo em Sofia toda a ação da caridade, podia mortificar as novas amigas, e fazer‐lhe perder em um dia o trabalho de longos meses. Assim se explica o artigo que a mesma folha trouxe no número seguinte, nomeando, particularizando e glorificando as outras comissárias – “estrelas de primeira grandeza” .
Machado de Assis, Quincas Borba .
No excerto, o autor recorre à intertextualidade, dialogando
com a comédia de Molière, Tartufo (1664), cuja personagem
central é um impostor da fé. Tal é a fama da peça que o nome
próprio se incorporou ao vocabulário, inclusive em português,
como substantivo comum, para designar o “indivíduo
hipócrita” ou o “falso devoto”. No contexto maior do
romance, sugere‐se que a tartufice
✂️ a) se cola à imagem da leitora, indiscreta quanto aos amores
alheios. ✂️ b) é ação isolada de Sofia, arrivista social e benemérita
fingida. ✂️ c) diz respeito ao filósofo Quincas Borba, o que explica o
título do livro. ✂️ d) se produz na imprensa, apesar de esta se esquivar da
eloquência vazia. ✂️ e) se estende à sociedade, na qual o cinismo é o trunfo dos
fortes.