A vida deveria nos oferecer um lugarzinho no rodapé
da nossa história pessoal para eventuais erratas,
como em tese de doutorado. Pelas vezes em que na
infância e adolescência a gente foi bobo, foi ingênuo,
foi indesculpavelmente romântico, cego e teimoso,
devia haver uma errata possível. Como quando a gente
acreditou que se fosse bonzinho ganharia aquela bicicleta;
que todos os professores eram sábios e justos e todas as
autoridades decentes; e quando a gente acreditou que
pai e mãe eram imortais ou perfeitos.
Devia haver erratas que anulassem bobagens adultas:
botei fora aquela oportunidade, não cuidei da minha grana,
fui onipotente, perdi quem era tão precioso para mim, escolhi
a gostosona em lugar da parceira alegre e terna; fiquei
com aquele cara porque com ele seria mais divertido, mas
no fundo eu não o queria como meu amigo e pai dos meus
filhos. Profissionalmente não me preparei, não me preveni,
não refleti, não entendi nada, tomei as piores decisões.
Ah, que bom seria se essas trapalhadas pudessem ser
anuladas com uma boa errata! Em geral, não podem.
Por todas as vezes que desviamos o olhar lúcido ou
recolhemos o dedo denunciador, pagaremos — talvez
num futuro não muito distante — um alto preço, durante
um tempo incalculavelmente longo. E não haverá erratas.
LUFT, L. Errata de pé de página. Veja, n. 28, 18 jul. 2007 (adaptado).
No texto, a autora propõe o uso metafórico da errata
como recurso para
✂️ a) assumir uma posição humilde diante da efemeridade
da vida. ✂️ b) evitar decisões equivocadas advindas da inexperiência. ✂️ c) antecipar as consequências das nossas ações. ✂️ d) promover um maior amadurecimento intelectual. ✂️ e) rever atitudes realizadas no passado.