Veiculou-se recentemente a notícia de que um fóssil brasileiro, um raro vegetal petrificado de 130 milhões de anos, permitiu um importante avanço na história evolutiva das plantas. Só que a descoberta não é obra de brasileiros, mas, sim, de suecos e alemães, uma vez que o fóssil foi contrabandeado para fora do país. O patrimônio paleontológico brasileiro - os restos petrificados de animais e vegetais que um dia compuseram nossa fauna e flora - está sendo literalmente dilapidado.
O fóssil da descoberta foi coletado no Ceará, na chapada do Araripe, que reúne alguns dos mais fabulosos tesouros fossilizados do país. É também o centro de contrabando de relíquias pré-históricas. Museus europeus e japoneses mantêm peças retiradas ilegalmente da chapada. Elas normalmente são encontradas em pedreiras por moradores da região que as vendem por valores irrisórios - como R$ 1,00 ou uma cerveja - a atravessadores.
Seria tentador acusar os grandes museus estrangeiros de receptação de objeto roubado, mas, pela legislação de países da Europa, os espécimes foram obtidos regularmente. Lá não é ilegal particulares encontrarem e venderem fósseis - exceto quando subtraídos de sítios previamente selecionados. A diferença é que num país como a Alemanha você não escava um esqueleto do homem de Neanderthal e sai com ele debaixo do braço. No Brasil, pode-se topar com fósseis de centenas de milhões de anos e encontrar um contrabandista disposto a arrematá-los por uma ninharia. É um problema que teremos de resolver se quisermos preservar nosso patrimônio paleontológico.
(Editorial da Folha de São Paulo, 23/06/2003, adaptado)