Meu irmão é filho adotivo. Há uma tecnicidade no termo,
filho adotivo, que contribui para sua aceitação social. Há uma
novidade que por um átimo o absolve das mazelas do passado,
que parece limpá-lo de seus sentidos indesejáveis. Digo que
meu irmão é filho adotivo e as pessoas tendem a assentir com
solenidade, disfarçando qualquer pesar, baixando os olhos
como se não sentissem nenhuma ânsia de perguntar mais
nada. Talvez compartilhem da minha inquietude, talvez de
fato se esqueçam do assunto no próximo gole ou na próxima
garfada. Se a inquietude continua a reverberar em mim,
é porque ouço a frase também de maneira parcial — meu irmão
é filho — e é difícil aceitar que ela não termine com a verdade
tautológica habitual: meu irmão é filho dos meus pais. Estou
entoando que meu irmão é filho e uma interrogação sempre
me salta aos lábios: filho de quem?
FUCKS, J. A resistência. São Paulo: Cia. das Letras, 2015.
Das reflexões do narrador, apreende-se uma perspectiva
que associa a adoção
✂️ a) a representações sociais estigmatizadas da parentalidade. ✂️ b) à necessidade de aprovação por parte de desconhecidos. ✂️ c) ao julgamento velado de membros do núcleo familiar. ✂️ d) ao conflito entre o termo técnico e o vínculo afetivo. ✂️ e) a inquietações próprias das relações entre irmãos.