Marília acorda
Tomo café em golinhos para não queimar meus lábios
ressequidos. Como pão em pedacinhos para não engasgar
com um farelo mais duro. Marília come também, mas olha
o tempo todo para baixo. Parece que tem um acanhamento
novo entre a gente. Termino. Olho mais uma vez pela janela.
O dia está bom. Quero caminhar pelo pátio. Marília levanta,
pega o andador e põe ao lado da cama. Ela sabe que eu
quero levantar sozinha, e levanto. O lance de escadas,
apesar de pequeno, ainda me causa problemas, mas não
quero um elevador na casa e não vou tolerar descer uma
rampa de cadeira de rodas. Marília abre a porta e saímos
para a manhã. O dia está mais fresco do que eu imaginava.
Ela pega uma manta de tricô que temos desde não sei
quando e põe sobre as minhas costas. Ela aperta meus
ombros com muita força, porque mesmo depois de todos
esses anos, não descobriu a medida certa do carinho.
Eu gosto. Porque entendo que naquele ato, naquela força
está o nosso carinho.
POLESSO, N. B. Amora . Porto Alegre: Não Editora, 2015.
Nesse trecho, o drama do declínio físico da narradora
transmite uma sensibilidade lírica centrada na
✂️ a) necessidade de fazer adaptações na casa. ✂️ b) atmosfera de afeto fortalecido pelo convívio. ✂️ c) condição de dependência de outras pessoas. ✂️ d) determinação de manter a regularidade da rotina. ✂️ e) aceitação das restrições de mobilidade da personagem.